A influenciadora Mariana Ferrer tinha 20 anos quando se tornou embaixadora de um requintado beach club em Florianópolis, o Cafe de La Musique. Um ano depois, a jovem reuniu coragem para denunciar um estupro dentro do estabelecimento. Segundo Mariana, em 15 de dezembro de 2018, ela foi dopada e violentada por um empresário, que seria amigo dos proprietários do local. O caso todo veio à tona nas redes sociais da própria Mariana, que, em busca de justiça, resolveu tornar a situação pública. “Não é nada fácil ter que vir aqui relatar isso. Minha virgindade foi roubada de mim junto com meus sonhos. Fui dopada e estuprada por um estranho em um beach club dito ‘seguro e bem conceituado’ da cidade”, disse ela, ao falar sobre o assunto pela primeira vez. Mariana utilizou a rede social para expor detalhes do ocorrido na noite de dezembro. Vídeos em que aparece se apoiando nas paredes, sem conseguir andar sozinha, prints pedindo socorro a amigas que estavam no local, além da foto do vestido que usava na noite todo ensanguentado.
Segundo uma reportagem da revista “Marie Claire” à época, os exames feitos por Mariana comprovaram o estupro. O sêmen encontrado na calcinha da jovem, que era virgem, era de André de Camargo Aranha, atualmente de 43 anos, empresário influente do ramo do futebol, apontado como amigo de jogadores famosos. Desde a denúncia, Mariana Ferrer promoveu uma verdadeira cruzada contra seus abusadores nas mais diversas plataformas. A hashtag #justicapormariferrer possui centenas de milhares de comentários questionando a atuação da Justiça, e já chegou aos mais diversos perfis, como o da cantora Ludmilla, da atriz Débora Nascimento e da também influencer Débora Aladim. “O caso da Mari Ferrer é uma derrota para todas as mulheres. Ela foi estuprada, tem vídeo, tem conversa, tem exame que comprovou que tinha sêmen do estuprador nela e que ela foi drogada para ficar desacordada. Ser mulher no Brasil é ter um alvo nas costas”, escreveu.
Em agosto, depois de acusar a defesa de Aranha manipular os conteúdos contendo denúncias compartilhados por ela no Instagram, a conta foi suspensa – e até agora não foi recuperada. Ela escreveu: “A defesa de forma sórdida e ardilosa protocolou dentro do processo fotos manipuladas como se eu estivesse nua (nunca fotografei assim) e anexou junto um site indevido fazendo correlação ao produto de skincare que já divulguei como influenciadora juntamente das imagens deturpadas”. Em sentença publicada nesta quarta-feira, 9, o juiz Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, absolveu Aranha. O magistrado acatou os argumentos da defesa, que houve ausência de “provas contundentes nos autos”. Segundo o Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC), responsável pela acusação, as provas da autoria são “conflitantes entre si”. “Portanto, como as provas acerca da autoria delitiva são conflitantes em si, não há como impor ao acusado a responsabilidade penal, pois, repetindo um antigo dito liberal, ‘melhor absolver cem culpados do que condenar um inocente’. A absolvição, portanto, é a decisão mais acertada no caso em análise, em respeito ao princípio na dúvida, em favor do réu (in dubio pro reo), com base no art. 386, VII, do Código de Processo Penal”, escreveu o juiz.
O magistrado afirma, na sentença de mais de 51 páginas, que não é possível saber quem está mentindo. “Diante das versões controvertidas, vislumbra-se não ser possível aferir quem faltou com a verdade, sendo notório que o relato da vítima é prova isolada nos autos, corroborada tão somente por sua genitora. A versão não está em harmonia com os demais elementos probandi colhidos durante a instrução criminal, gerando dúvidas em relação à prática delitiva em comento. Diante disso, não há como condenar o acusado por crime de estupro, quando os depoimentos de todas as testemunhas e demais provas (periciais) contradizem a versão acusatória.”
O caso, que mobiliza muitas mulheres e homens nas redes sociais há mais de um ano, causou muita revolta. A acusação ainda poderá recorrer na sentença. De acordo com dados do 13º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em setembro de 2019 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, só em 2018, o país registrou 66.041 crimes do tipo – 180 por dia, o que significa que a cada hora, mais de sete mulheres são violentadas sexualmente.