Saúde debilitada. “Eles são muito mais vulneráveis que a maioria da população que habita outras cidades”. A frase de Hélcio Souza, gerente da estratégia indígena da TNC Brasil, retrata a situação das populações mais vulneráveis da Amazônia. As internações são, muitas vezes, inevitáveis, o que leva uma parcela dos ribeirinhos a um cotidiano de idas e vindas aos postos de saúde e hospitais. O drama sanitário de tantos povos que vivem na região é agravado pelas queimadas que causam um grave problema de saúde pública, sem falar no impacto ecológico. O número de internações salta drasticamente em razão aos danos ao sistema respiratório de moradores e trabalhadores das áreas acometidas pelo fogo. A produtora Irene Pereira sentiu na pele diversas vezes os danos provocados pela fumaça e diz ser um alívio os períodos sem queimada. “Maior benefício de não usar o fogo é o ar mais puro, a gente respira melhor”, diz.
A rede hospital é duramente afetada e sobrecarregada na Amazônia. Em tempos de pandemia, o antedimento que já está bastante pressionado pela Covid-19 pode ganhar ares de colapso. O médico e professor da faculdade de medicina da Universidade de São Paulo, Paulo Saldiva, indica que a fuligem da queimada é tão impiedosa quando a poluição, sendo praticamente a mesma coisa que estar em um grande centro urbano com muitos carros e fábricas. “Como acontece nas grandes cidades, a poluição veicular, a queima e a poluição de leva a um drama de saúde imensurável com aumento significativo de doenças respiratórias e cardiovasculares. Ou seja, não é só um problema ecológico, é também de saúde da população”, explica.
Os pequenos também sofrem com as circunstâncias da devastação pelas chamas. Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) revela que o número de crianças internadas dobra nas localidades afetadas por queimadas na Amazônia. De acordo com o estudo, viver em um cidade próxima aos focos de incêndio aumenta em 36% o risco de internação. O sanitarista da fundação, Christovam Barcellos, expõe um quadro critico na chamada zona do fogo. “Houve aumento de internações muito grande na Amazônia, principalmente em uma área que se chama área do desmatamento ou zona do fogo. Nesse local, onde acontece a maior parte das queimas, dobrou o número de internações. Os municípios onde houve queimada existe um aumento de 50% nas internações de crianças por problemas respiratórios.”
Em 2019, nos lugares da Amazônia onde mais aconteceram incêndios o ar ficou, em média, 53% mais poluído do que em 2018. Sob os efeitos da pandemia, segundo especialistas, o cenário aponta para a chamada tempestade perfeita, quando a exposição a fumaça pode resultar em uma maior predisposição a infecção pelo coronavírus. Os dados, no geral são alarmantes. E como se não bastasse, a região norte tem um dos piores índices de infraestrutura hospitalar e de leitos de unidade de terapia intensiva (UTI), o que leva muitos residentes de áreas longínquas a percorrer horas e até dias em busca de atendimento. O jeito, de acordo com Hélcio Souza, tem sido recorrer a alternativas provisórias, que são insuficientes para suprir a demanda. Por isso, ele ressalta que há necessidade de uma ação emergencial com investimento para evitar o chamado “quebra-galho”. “Em algumas regiões os povos indígenas tem conseguido fazer parcerias com médicos voluntários e estão montando enfermarias de campanha com respiradores, que estão ajudando a resistir em partes, mas isso ainda é muito insuficiente. Então tem a necessidade de ter um reforço urgente nesse sistema público para povos indígenas. É gritante.”
*Com informações do repórter Daniel Lian