Delação vazada de Mauro Cid sobre suposto plano de golpe fala em duas frentes de ação

Depoimento de ex-ajudante de ordens, feito em agosto de 2023, revela duas alas no entorno de Bolsonaro: uma mais radical, da qual Michelle e Eduardo faziam parte, e outra que resistia ao uso de força armada.

Brasília – A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), esposa e filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, teriam incentivado a possibilidade de um golpe de Estado após a derrota nas eleições de 2022 contra Luiz Inácio Lula da Silva, de acordo com a delação premiada do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, feita em agosto de 2023.

O conteúdo desse depoimento foi revelado inicialmente pelo jornalista Elio Gaspari nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo e confirmado pelo Estadão. Segundo Cid, os dois integravam um grupo mais radical que defendia o uso do apoio popular e dos CACs (caçadores, atiradores e colecionadores) para implementar o golpe. Nenhum dos dois, no entanto, foi indiciado pela Polícia Federal (PF), e, até o momento, o depoimento não trouxe evidências concretas que embasem acusações formais contra eles.

Procurados, Jair e Michelle Bolsonaro não responderam aos contatos da reportagem. O mesmo ocorre com a defesa de Eduardo Bolsonaro. O espaço segue aberto para manifestações.

Grupos no entorno de Bolsonaro

De acordo com Cid, havia três grupos distintos no entorno de Jair Bolsonaro:

  1. O mais radical, composto por Michelle e Eduardo Bolsonaro, além de ex-ministros como Onyx Lorenzoni (PL) e Gilson Machado (PL); senadores como Magno Malta (PL-ES) e Jorge Seif (PL-SC); e outros aliados, como o ex-assessor internacional Filipe Martins e o general Mario Fernandes. Este grupo defendia o golpe armado e a assinatura de um decreto que instaurasse o regime golpista.
  2. Uma ala menos radical, que buscava encontrar supostas fraudes nas urnas eletrônicas, mas rejeitava o uso de força armada.
  3. O grupo que acreditava que “nada poderia ser feito” após a derrota eleitoral, mas que se dividia entre os que sugeriam que Bolsonaro deveria deixar o país e os que defendiam que ele ordenasse o fim das manifestações em frente aos quartéis.

No grupo que aconselhava o envio dos manifestantes para casa estavam o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o então advogado-geral da União Bruno Bianco, o ministro da Casa Civil e atual senador Ciro Nogueira (PP-PI) e o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior.

Ações planejadas pelo grupo radical

Ainda conforme a delação, membros do grupo mais radical chegaram a elaborar estratégias detalhadas para o golpe, incluindo um suposto planejamento operacional para o assassinato do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e dos então candidatos eleitos Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin.

Entre os responsáveis por essas ações estavam o general Mario Fernandes, que elaborou o planejamento, e Filipe Martins, que teria atuado na interlocução com juristas para redigir uma “minuta do golpe”.

Desdobramentos e indiciamentos

Até o momento, mais de 40 pessoas foram indiciadas pela PF por participação na tentativa de golpe. Entre os investigados estão o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, que, segundo as investigações, pressionou comandantes das Forças Armadas a aderirem ao plano golpista.

Segundo a PF, Nogueira de Oliveira convocou reuniões com oficiais de alta patente para cobrar adesão ao golpe. Apesar de a maioria rejeitar o plano, o general Estevam Theóphilo foi encarregado de organizar ações das tropas terrestres caso o decreto fosse assinado.

Ainda de acordo com Mauro Cid, o temor de que Bolsonaro assinasse o decreto era generalizado. O então comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes, foi um dos mais preocupados com as possíveis consequências de um golpe de Estado.

As investigações continuam, com novos depoimentos e desdobramentos que podem mudar o cenário político e jurídico envolvendo os principais personagens citados.

By Ewerton Souza

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