O corregedor-nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), instaurou nesta quarta-feira, 12, um procedimento para apurar a conduta da juíza Inês Marchalek Zarpelo, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, no Paraná, após ela citar, em decisão proferida em junho, que o réu Natan Vieira da Paz participava de grupo criminoso “em razão de sua raça”. Na decisão que instaura o procedimento, o ministro destaca o trecho da sentença proferida pela juíza, cita a relevância que o teor da afirmação ganhou na imprensa e no meio jurídico e afirma que há “a necessidade de se averiguar os fatos que, em tese, podem caracterizar conduta que infringe os deveres dos magistrados estabelecidos na LOMAN e no Código de Ética da Magistratura”.
A advogada de Natan, Thayse Pozzobon, afirmou à Jovem Pan que vai buscar a anulação da sentença. “Entramos em contato com a OAB do Paraná que, inclusive, já emitiu nota, e o presidente da seção do Paraná também já se manifestou. Estou em contato com comissões de igualdade racial e direitos humanos da OAB e, quanto à sentença do Natan, nós buscamos a anulação, já que foi prolatada por uma juíza, aparentemente e ao que tudo indica, parcial”.
Na decisão, Zarpelo afirma que sobre a “conduta social” do réu “nada se sabe. Seguramente integrante do grupo criminoso, em razão de sua raça”. “Agia de forma extremante discreta os delitos e o seu comportamento, juntamente com os demais, causavam o desassossego e a desesperança da população, pelo que deve ser valorada negativamente”, completa a juíza. Natan foi condenado a 14 anos de prisão em regime fechado por roubos praticados em organização criminosa.
Enviado à Jovem Pan, o pedido de providências do CNJ determina o prazo de 30 dias para apuração dos fatos narrados. “A expedição de ofício à Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná para que, no prazo de até 30 (trinta) dias, apure os fatos narrados no presente expediente, remetendo-se a esta Corregedoria Nacional de Justiça o resultado da apuração”, decide o ministro.
Por meio da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), a juíza divulgou nota pedindo desculpas e afirmou estar “profundamente entristecida se fiz chegar, de forma inadequada, uma mensagem à sociedade que não condiz com os valores que todos nós devemos diuturnamente defender”. Ela, no entanto, afirmou que a frase “foi retirada de um contexto maior”. “Em nenhum momento a cor foi utilizada – e nem poderia – como fator para concluir, como base da fundamentação da sentença, que o acusado pertence a uma organização criminosa. A avaliação é sempre feita com base em provas. A frase foi retirada, portanto, de um contexto maior, próprio de uma sentença extensa, com mais de cem páginas. Reafirmo que a cor da pele de um ser humano jamais serviu ou servirá de argumento ou fundamento para a tomada de decisões judiciais”, diz a magistrada.
Em nota, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do Paraná, informou que vai acompanhar o “desenrolar dos fatos” e reitera a apuração da conduta da magistrada. “A OAB-PR comunica que, na condição de defensora intransigente das garantias fundamentais, está encaminhando às autoridades do Poder Judiciário e do Ministério Público pedido de apuração e aplicação das sanções que o caso reclama e que acompanhará todo o desenrolar desses fatos”