Fantástico descobriu que ele é investigado por lavagem de dinheiro e corrupção na movimentação de R$ 730 mil em 2020.
Na última terça-feira (19), uma sessão marcou a história da Câmara Municipal de São Paulo, quando determinou pela primeira vez a cassação de um vereador por causa de comentários racistas.
O caso ocorreu em maio de 2022, quando Camilo Cristófaro disse, em uma sessão virtual, a seguinte frase: “Eles não lavaram nem a calçada, é coisa de preto, né?”
O placar terminou com quarenta votos “sim” pela cassação por quebra de decoro, cinco abstenções e nenhum voto “não”.
Camilo ainda tem que prestar contas às autoridades por outros motivos. O Fantástico também descobriu que ele é investigado por lavagem de dinheiro e corrupção. De acordo com o Conselho de Controle de Atividades Financeira que ele movimentou R$ 730 mil em nove meses de 2020.
O valor se refere a depósitos e pagamentos de contas feitos entre funcionários e Camilo. Ou seja, Cristófaro é suspeito de envolvimento em esquema de rachadinha.
À polícia, Camilo alegou que os pagamentos foram de caráter pessoal. A defesa dele diz que o cliente não cometeu crime algum.
Acusação de racismo
Na sessão virtual de maio de 2022, uma fala do vereador vazou para os parlamentares. O presidente da CPI, o vereador Adilson Amadeu, do União Brasil, pediu para cortar o microfone de Camilo, mas a vereadora Luana Alves, do PSOL, tomou a palavra.
“Não, não, não vai desligar não. Acho que ele falou alguma coisa de… Não, não, não. Acabou de ficar registrado. Acaba de proferir uma fala extremamente racista. Eu queria não acreditar que essa fala existiu, mas infelizmente existiu”, disse a vereadora.
Após o tumulto, Camilo gravou um vídeo da garagem onde estava. Ele tem uma coleção de fuscas e diz que se referia a um carro preto.
“É exatamente os que dão trabalho. Carro preto são ‘f'”, falou.
Após 40 minutos, Camilo chega ao Plenário se senta ao lado de Luana, que troca de lugar. Depois, no Colégio de Líderes, diz que foi uma brincadeira com um amigo.
“Se eu errei, porque eu tenho essa intimidade com ele. Ele é um irmão meu, o Anderson Chuchu”, conta.
No dia seguinte, Camilo divulgou um novo vídeo em suas redes dizendo que fez uma brincadeira infeliz e que nunca foi racista. No mesmo dia, ele deixou o partido ao qual pertencia, o PSB, em comum acordo. Atualmente está no Avante.
Caso vai parar na Justiça
No dia 5 de maio, a vereadora Luana denunciou Camilo à polícia por racismo. Em depoimento, Anderson Chuchu disse que não se sentiu ofendido.
No começo deste ano, Camilo foi absolvido. O juiz disse que o vereador não teve a intenção de ofender ninguém. O Ministério Público está recorrendo.
Julgamento
Em paralelo, Luana e mais três vereadores também denunciaram Camilo para a Corregedoria da Câmara Municipal, que começou um processo de cassação no início do ano, que culminou na sessão de terça-feira, que o Fantástico acompanhou.
“Racismo não é algo menor. Não é uma coisa que você leva no contexto da brincadeira. Existe uma estafa, um cansaço da população, em especial das pessoas negras, das pessoas racializadas, pessoas periféricas, de se verem desrespeitadas”, disse a vereadora Luana Alvez no dia da sessão, que também contou com protestos antirracistas.
No julgamento da cassação, realizado na última terça (19), o advogado de Camilo o compara com o nazista Adolf Eichmann, responsável pelo extermínio de judeus e que, segundo ele, teve um julgamento injusto, como estaria sendo o de Cristófaro.
“Ele era encarregado da logística, de mandar judeus para o campo de concentração”, diz Ronaldo Alves Andrade ao comparar seu cliente com o nazista que foi condenado à morte em 1961 por crimes contra a humanidade.
O advogado foi interrompido várias vezes e se envolveu em um bate-boca com um vereador.
Ao ter a palavra, Cristófaro cita Milton Leite, do União Brasil, presidente da Câmara.
“Todos os vereadores antigos chamavam o vereador Milton Leite de Negão. Agora pergunta se o Camilo algum dia chamou o vereador Milton Leite de Negão? Nunca, nunca, nunca”, falou Camilo Cristófaro.
Milton Leite rebateu: “Mais um momento de ofensa. É uma forma de racismo de novo na tribuna. Ele é um racista costumaz, e isso eu não aceito”.
Camilo não pediu desculpas a ninguém e perdeu o mandato naquele dia. O placar terminou com quarenta votos pelo sim pela cassação por quebra de decoro, cinco abstenções e nenhum voto pelo não.
“É uma decisão firme da Casa que aponta para a sociedade paulista o seguinte, o racismo é intolerável e inaceitável na cidade e diante de seus parlamentares”, conclui Milton Leite.
Quem é Camilo Cristófaro?
O vereador tem 63 anos e começou na política aos 18 anos. Ocupou vários cargos na prefeitura e se elegeu em 2016 com o slogan de que acabaria com a “indústria da multa”. Foi reeleito em 2020 e tem uma trajetória de polêmicas:
Em 2017, discutiu com um homem num corredor da Câmara, depois derrubou outro no chão;
Em 2017, discutiu com a então vereadora Isa Penna (PSOL). Segundo ela, Camilo disse: “Vagabunda, terrorista. Não se surpreenda se você tomar uns tapas na rua”;
Em 2019, Fernando Holiday (PL) sofreu um ataque racista de Camilo, que proferiu a frase: “Ele dando risadas nas redes sociais. Se divertindo que nem um macaco de auditório”;
Em 2020, ofendeu o então vereador George Hato(MDB): “É um cara que faz assim (estica os olhos). É o George Hato mesmo”;
Em 2022, Camilo mandou um áudio ameaçando o vereador Marlon Luz (MDB): “Vou dar um tapa na sua cara, se você chamar a atenção. Você está falando com homem, não está falando com moleque”.
Fora da Câmara, Camilo é réu em um processo de injúria racial. Uma catadora de materiais recicláveis e outras sete testemunhas disseram que ele a ofendeu em um evento, em 2020, no Centro da cidade.
“Ele já veio com o dedo na minha cara. E eu pensei que ele ia me bater: negra bandida, negra traficante, negra golpista, negra oportunista”, relembra ela.
Procurado pela reportagem, Camilo Cristófaro não quis gravar entrevista.
Em nota a assessoria dele disse que “a Câmara cometeu uma grande injustiça, uma vez que a justiça criminal examinou os mesmos fatos e absolveu Camilo das acusações”.