O ministro Luiz Fux assume a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), a partir desta quinta-feira (10), com a missão de distanciar o colegiado do governo federal, postura oposta à adotada pelo seu antecessor, Dias Toffoli, que buscou colocar o Judiciário como participante da governabilidade de Jair Bolsonaro (sem partido). Conhecido pelo seu alinhamento com a operação Lava Jato, Fux chega ao posto máximo da Corte no momento que a operação está abalada pelos atritos com a Procuradoria-Geral da República (PGR), culminando com o afastamento de Deltan Dallagnol da coordenadoria da força-tarefa. Para o constitucionalista e professor de Direito do Insper Diego Werneck Arguelles, o novo presidente também tem que lidar com os ânimos dos outros membros da Corte, principalmente em um ambiente politicamente deflagrado. Como exemplo, ele cita as críticas que o ministro Celso de Mello fez à gestão de Bolsonaro, enquanto Toffoli buscava uma posição mais conciliadora. “Se ele tiver uma posição de liderança, pode conseguir canalizar esses comportamentos individuais para questões mais institucionais. Isso depende de ele ter trânsito e respeito dos pares”, afirma.
O afastamento da Corte dos outros poderes também é um desafio que Fux vai precisar enfrentar nos próximos dois anos que estiver na cadeira de presidente. No dia 1º de setembro, Toffoli agradeceu a Bolsonaro pelo “diálogo e pela cooperação em prol da construção de um país mais justo e que trilhe o caminho do desenvolvimento social, econômico e regional”, durante evento no Palácio do Planalto. “As declarações de Toffoli em cooperar com o governo foram negativas. Não é a imagem que se espera de quem tem que ser árbitro do que o governo faz”, afirma Arguelles.
Thomas Pereira, professor de Direito Constitucional da FGV Rio, concorda. Segundo ele, a gestão de Toffoli ficará marcada pelo viés do ex-presidente em colocar o STF como participante da governabilidade federal. “Uma vez que o ministro está em posição de presidente, ele é cobrado e precisa se posicionar em nome da instituição. E isso depende muito dos acontecimentos, como os ataques feitos ao STF. Não dá para dizer como [Fux] vai se comportar na cadeira diante de ataques, mas as posições que ele teve anteriormente foram de defesa.” A aproximação com a Lava Jato pode ser outro percalço de Fux à frente do comando do colegiado. O ministro se mostrou aliado da força-tarefa em posicionamentos defendidos na Corte, e em mensagens supostamente trocadas entre o então juiz Sergio Moro com o procurador da República e ex-coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, Moro teria escrito “In Fux we trust” (Em Fux nós confiamos). Desde então, a operação sofreu uma série de reveses, desde o pedido de demissão de Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública, até a saída de Dallagnol da coordenadora após ser alvo de processos.
“O principal poder que Fux vai ter é o de influenciar nas pautas que serão discutidas em plenário. Em pautas de defesa da Corte se percebe a união dos ministros, mas temas mais polêmicos, como a Lava Jato, geram divisão”, afirma o professor da FGV. Para Arguelles, o momento delicado, como os últimos atritos com a PGR, pode ser um agravante nas dificuldades. “Desde a saída de Moro do governo, ele virou uma figura controvertida, isso também é uma mudança significativa. É um assunto delicado dentro e fora do tribunal, e um tema que divide e não há expectativa de unanimidade entre os membros da Corte.”
Além dos desafios naturais impostos ao presidente do Judiciário nacional, Fux assume o cargo em meio às piores crises sanitária e econômica do século. Em abril, o ministro votou favorável na ação que deu autonomia para que estados e municípios decidam como lidar com o isolamento social. A aprovação, considerada uma derrota ao governo Bolsonaro, foi unânime. “Algumas pautas do Supremo serão medidas de acompanhamento da Covid-19 para não gerar incerteza entre os gestores sobre como atuar na crise, e há convergência entre os membros do STF sobre as decisões da pandemia”, afirma o professor do Insper. O novo presidente também já indicou que irá pautar temas que favoreçam a retomada da economia. Segundo Pereira, no entanto, não há muitas colaborações com efeitos práticos que o Judiciário possa fazer para mitigar os efeitos desta outra frente da pandemia do novo coronavírus. “É muito difícil a Corte contribuir de alguma maneira para a economia, não é a função dela. Ela pode atuar em questões de insegurança, diminuindo a incerteza jurídica dos casos”, afirma.