O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu os processos no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) que podem tirar o procurador Deltan Dallagnol da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Os casos seriam julgados nesta terça-feira, 18, e miram a conduta de Dallagnol em relação à publicação nas redes sociais e supostas atitudes de promoção pessoal.
“Sabemos que regimes autocráticos, governantes ímprobos, cidadãos corruptos e autoridades impregnadas de irresistível vocação tendente à própria desconstrução da ordem democrática temem um Ministério Público independente, pois o Ministério Público, longe de curvar-se aos desígnios dos detentores do poder – tanto do poder político quanto do poder econômico ou do poder corporativo ou, ainda, do poder religioso -, tem a percepção superior de que somente a preservação da ordem democrática e o respeito efetivo às leis desta República laica revelam-se dignos de sua proteção institucional”, escreveu o magistrado.
“A remoção do membro do Ministério Público de suas atribuições, ainda que fundamentada em suposto motivo de relevante interesse público, deve estar amparada em elementos probatórios substanciais, produzidos sob o crivo do devido processo legal, garantido-se o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, sob pena de violação aos postulados constitucionais do Promotor Natural e da independência funcional do membro do Ministério Público”, frisou o decano.
Mello apontou que os fatos sobre investigação do CNMP já foram avaliados e arquivados, “que põe em perspectiva o dogma de que ninguém, em um Estado democrático de Direito, pode expor-se a situação de duplo risco”. Os dois processos disciplinares em questão foram apresentados pelos senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Katia Abreu (PP-TO). Enquanto Calheiros acusa Deltan de tentar influenciar as eleições para a presidência do Senado em 2019 ao publicar tuítes críricos ao partido, Katia Abreu questiona o acordo firmado entre a Lava Jato Paraná com a Petrobrás para detinar R$ 2,5 bilhões recuperados pela operação e que seriam geridos por uma fundação dos procuradores.
Ao recorrer ao Supremo, Deltan alega que não tem outra alternativa, e pede que a Corte trave o julgamento dos casos e, no mérito, seja determinado o seu trancamento, diante dos diversos vícios que os contaminam. O chefe da Lava Jato Paraná afirma que em suas declarações sobre as eleições do Senado no ano passado “apenas relatou um fato objetivo”, e e “agrega uma análise de cenário sobre o futuro das reformas anticorrupção”. À época, Deltan afirmou que, caso Renan Calheiros fosse eleito para comandar a Casa, “dificilmente veremos uma reforma contra a corrupção aprovada”. O procurador ainda destacou que o emedebista tinha “várias investigações por corrupção e lavagem de dinheiro”.
“Não há pessoas nem sociedades livres sem liberdade de expressão, de comunicação e de informação, mostrando-se inaceitável qualquer deliberação estatal, cuja execução importe em controle do pensamento crítico, com o consequente comprometimento da ordem democrática”, ressaltou Celso de Mello. Para o ministro, “qualquer medida que implique a inaceitável proibição ao regular exercício do direito à liberdade de expressão” dos membros do Ministério Público “revela-se em colidência com a atuação independente e autônoma garantida ao Ministério Público pela Constituição de 1988”.
* Com Estadão Conteúdo